A metamorfose
Autor: Franz Kafka
Editora: Saraiva de Bolso
Edição: 2011
Páginas: 70
“A metamorfose”, novela publicada em 1915, é uma narrativa fantástica em que o personagem central, Gregor Samsa, ao despertar certa manhã, “depois de um sono intranquilo, achou-se em sua cama convertido em um monstruoso inseto”. Depois desse começo abrupto, a história se desenvolve em torno das mudanças de comportamento que Gregor observa em si e na sua família.
A missão de hoje é complicadíssima. Afinal, não é fácil falar sobre A metamorfose de Franz Kafka. Pensando bem, não vou considerar este texto uma resenha. Vou (ou melhor, vamos) encarar como uma troca de ideias e interpretações. A verdade é que, apesar da imensa popularidade do livro e de ter uma noção sobre a história, há certas surpresas. Pelo menos houve na minha experiência de leitura.
Gregor Samsa é centro da família e provedor da casa. Até que em um dia qualquer, ao acordar, ele percebe que algo está MUITO diferente. Gregor está se transformando. Em um inseto. É, isso mesmo. Um inseto! E é através dessa metáfora que Franz Kafka constrói a história de A metamorfose.
Verdade seja dita: o começo da leitura não me empolgou. Apesar da narrativa em 3ª pessoa, o leitor acompanha a mudança pelo ponto de vista de Gregor. E bom, é lógico que ele não quer se revelar para a família. Ou adiar ao máximo o momento. E leitora ansiosa que sou, estava interessada no desenrolar do enredo depois da aparição. Ainda assim, este primeiro trecho é importante principalmente para refletir sobre nossas reações e sentimentos a partir de alguma mudança, qualquer que seja, da mais sutil a mais traumática.
A partir da descoberta da condição de Gregor o livro tem dois momentos marcantes na minha experiência de leitura: um deles, logo no começo da história, é a crítica sobre trabalho e como Franz Kafka expõe a relação entre padrão e empregado. Apesar dos momentos históricos distintos, a mentalidade dos patrões segue a mesma em muitos segmentos. O livro foi publicado há 100 anos e é extremamente atual que assusta.
Alguém pode ter um instante de incapacidade para o trabalho; mas então é precisamente quando os chefes devem lembrar-se de quão útil ele tem sido, e pensar que, passado o impedimento, voltará a ser tanto mais ativo e trabalhará com maior zelo.página 25
E, é claro, o grande mote do livro questiona as relações humanas (ou o que é ser humano, afinal de contas). Gregor era o provedor da família e a partir da mudança todo seu valor se perde. Através de certos diálogos e cenas acompanhamos as reações do pai, da mãe e da irmã. E não é nada agradável perceber como a relevância de alguém se desfaz tão rapidamente.
Em nenhum momento da história fiquei comovida ou com pena da família de Gregor depois de sua transformação. Nem com o próprio Gregor, pra falar a verdade. Porque a vida é assim e acho que está aí a grande mensagem de Franz Kafka. Algumas coisas nós podemos controlar e decidir, mas nem tudo. E quando um membro de um grupo muda, independente do grupo ou da mudança, todos ao redor mudam também. Direta ou indiretamente.
Mas, e apesar de tudo, era aquele realmente o seu pai? Era este aquele homem que antigamente quando Gregor se preparava para empreender uma viagem de negócios, permanecia cansado na cama? Aquele mesmo homem que, ao regressar à casa recebia-o em camisola, imerso em sua poltrona e que, por não estar em condições de se levantar, contentava-se em erguer os braços em sinal de alegria? Aquele mesmo homem que nos raros passeios dados em comum, em alguns domingos, ou nas festas principais, entre Gregor e sua mãe, cujo passo já por si mesmo era lento, mas que então encurtava-se ainda mais, avançava envolto em sua velha capa, apoiando-se cada vez que queria dizer algo, obrigando os outros a fazer um círculo em torno dele?
página 47
Enquanto eu lia o livro fiquei pensando naquelas famílias que rejeitam os filhos por suas escolhas, ou porque seguem um caminho diferente do planejado. Aquele que vira bandido, puta ou fica doente. A metáfora de A metamorfose é aplicável, basicamente, em qualquer espectro da vida e o máximo dessa leitura é exatamente isso.
Enfim, apesar do começo truncado foi uma leitura excelente e bastante construtiva. Lá no Skoob avaliei o livro com quatro estrelas. Não tenho certeza se consegui ressaltar ao longo do texto alguns dos meus pontos favoritos, mas questionar a humanidade sem dúvida é parte essencial da história. E fazer com reavaliemos nossas opiniões e impressões também. Leitura muito recomendada sim.
Minha edição é da Saraiva de Bolso/ Nova Fronteira, com prefácio de Jorge Luis Borges. O livro tem ótima fonte, entrelinha e é impresso em papel chambril, também amarelado. A tradução é de Torrieri Guimarães e não anotei erros de revisão. Espero que tenham gostado do post de hoje.
Beijos!
Fotos: Nine Stecanella
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